top of page

No campo de batalha, as armas são as palavras

  • Carlane Borges
  • 15 de jun. de 2016
  • 4 min de leitura

Na batalha da Roosevelt não existem regras e quando gritarem "Sangue!" a euforia vai às alturas.

O relógio marca por volta de 20:35 numa noite quente de quarta-feira (06/04/16). Muitas pessoas estão no ambiente, nem todas com os mesmos objetivos. De skate a bicicleta; de paquera a amigos; de cachorros a gatos; tem de tudo. A praça é extensa, de ponta a ponta se vê pessoas. Numa extremidade tem um posto policial, no outro uma base da guarda civil. Carros da polícia militar fazem a ronda do local, os sons são diversos e todos perceptíveis.

À esquerda da base policial um grupo começa a se organizar. De longe parece tumulto, mas não se ouve gritaria. Ao se aproximar o grupo é ainda maior. Lembra um ringue sem delimitações. Algumas pessoas estão no meio e falam alguma coisa. São dois jovens. O que se ouve é: "Não temos regras, a batalha é livre. E quem fala o que quer?" Quem está ao redor, familiarizado, responde: "ouve o que não quer!" E eles continuam "Para quem veio a primeira vez, não se assustem, pois aqui não tem regras, pode tudo. Do pescoço pra baixo, tudo é perna. Só não vale falar do cachorro." E todos concordam com a última colocação, sobre o cachorro não se fala.

Batalha da Roosevelt – Foto: Carlane Borges

Nesse ponto fica claro que se trata de uma batalha, especificamente de rap. A guerra não é feita com armas e, sim, com palavras. Avulsos, escolhidos por quem assiste, dois números são selecionados e correspondem a um MC, e assim são selecionados os participantes. Ambos são levados ao meio, é difícil passar, todos querem assistir. A partir do par ou ímpar decide-se quem começa. Não tem um tema definido, tudo está diretamente relacionado a inspiração do momento. Ouve-se, então, Paulo Vitor de Paula Camargo, 29, essa é a voz do começo e um dos organizadores, dizer: "Ae, família, silencio ao poeta" e começa a batalha.

De início cada MC tem 30 segundos para fazer seu show, baseado no insulto ao outro. A votação é feita pela plateia por meio dos gritos, nesse ponto, o barulho alcança seu auge. Passada a vez correspondente a cada, vem a disputa direta, ou o que eles chamam "Sangue". Um fala e o outro responde. O MC que ganha pela votação do público disputará com os outros ganhadores, até uma final. O prêmio, conta Paulo "É o boné, tudo o que a galera coloca. A batalha inteira a gente vai passando o boné e o que tiver dentro o campeão leva tudo. O pessoal coloca laranja descascada, agora tinha uma cabeça de alho, tem dinheiro, tem coisa para comer, tem cigarro, tem tudo. A intenção é a brincadeira e não o dinheiro, o boné é mais para tirar um sarro." Ao fim de cada batalha os participantes cumprimentam-se em sinal de respeito e de que tudo não passa de uma brincadeira.

Primeira batalha da noite – Foto: Carlane Borges

Quando se fala em rap, o imaginário cria um certo perfil de pessoa, porém na Batalha da Roosevelt isso não é possível. O público é muito diverso. Os homens se sobressaem, mas muitas mulheres assistem. Em conversa com um dos MC's participantes, Tiago Vitor Salado, levanta-se a questão de não haver meninas competindo e ele desabafa "Tem as minas também, só que elas não participam muito. Por motivos que vocês devem imaginar. Tipo, uma mina ouvindo várias bostas, de vários malucos. É tanto que, hoje em dia, as minas estão fazendo várias batalhas só de mulheres, mas o certo mesmo seria tudo misturado." Tiago, além de MC é professor de inglês e beatbox. Segundo ele, aquele não era um dia para estar ali devido a faculdade, mas naquela quarta específica não haveria aula.

Outro MC que também estava participando da batalha naquele dia era Bruno Souza, de 18 anos e que trabalha com jurídico. Ele nos conta como conheceu as batalhas e o rap "Eu zoava muito com o meu irmão e ele retrucava usando rima, quatro anos mais novo e eu não conseguia fazer igual. Comecei a assistir bastante batalhas e de lá para cá comecei a frequenta-las e participar. No começo não sabia quase nada, com o tempo veio a experiência". Bruno estava na disputa pelo prêmio. Ele conhecia a Praça, pois andava de skate por lá, mas não sabia da batalha, a descobriu quando participou de uma outra que acontece próximo a estação Sta. Cruz do metrô.

Bruno e seu primeiro adversário - Foto: Tainara Cavalcante

A batalha não poderia acontecer no local devido a lei do silêncio, por isso os organizadores fizeram um acordo com a polícia. O horário estipulado para o evento acontecer é das 20h às 22h, mas aconteceu um atraso. Quando o ponteiro do relógio marcou às 22h os policiais se aproximaram e a batalha não havia sido finalizada, um lamento. Decidiu que poderia continuar acontecendo, mas que fosse levada para mais distante dos prédios, diante a igreja seria o ideal. Em áudio captado é possível ouvir um policial dizer "os moradores, pessoal, tem uma espécie de binóculo, zoom, sei lá. Então, para mim o barulho está sendo agradável, mas na verdade, acho que a eles incomoda. Sai do visual deles, vão para a frente da igreja, está fechada ". Não foi possível acompanhar a batalha até o fim, pois a hora avançava. Nos despedimos e ouvimos de volta da maioria "Tchau, foi um prazer, voltem mais vezes e adiciona a galera nas redes sociais".

Curiosidades: A frase: "Silêncio para o poeta falar" é usada em todas as batalhas e o intuito é pedir silencio para que a batalha ocorra.

Período: Todas às quartas-feiras Horários: 20h às 22h Onde: Praça Roosevelt. Como chegar: A praça está localizada no centro de São Paulo, os meios mais fáceis de chegar são ônibus e metrô. Estações próximas: Anhangabaú e República

Outras Batalhas: Batalha do Point- Galeria Olindo, centro. Todas às quintas do mês. À partir das 20h. Batalha do Santa Cruz- Metrô Santa Cruz- Todos os sábados. 20h30. Sexta Free - Esquina da Paulista com a rua Augusta. 20h30. Parque dos MC's- Metrô Carandiru. Domingo. 16h.


Comments


Follow Us
  • Twitter Basic Black
  • Facebook Basic Black
  • Black Google+ Icon
Recent Posts

© 2023 by Glorify. Proudly created with Wix.com

bottom of page